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celina pereira

Morreu esta quinta-feira, 17, em Lisboa, Portugal, vítima de doença, a cantora cabo-verdiana Celina Pereira, que foi uma das impulsionadoras da ideia que levou o Governo de Cabo Verde a propor à Unesco a classificação da morna como Património Imaterial da Humanidade.

A morte da cantora foi confirmada pela página “Nos Morna, Noz Morabeza” (Nossa Morna, Nossa Morabeza) no facebook, que lembrou que o passamento físico de Celina Pereira deu-se hoje, nove anos depois da morte de Cesária Évora, outra figura da cultura cabo-verdiana.

Há muito que a cantora se encontrava com a saúde debilitada, tendo sido internada num dos hospitais de Lisboa, devido à uma descompensação respiratória.

Depois de adoecer, Celina Pereira permaneceu no lar de idosos da Santa Casa da Misericórdia, onde hoje faleceu. Nesta instituição, Celina Pereira trabalhou no arranque do ano lectivo 2017/2018, com o projecto na área da educação para a cidadania “Nós Somos de todo mundo”.

Mas, ainda em 2016, representou a lusofonia no Festival Music Now, que decorreu em Atenas.

Celina Pereira, natural da ilha da Boa Vista, herdou a veia artística da família. O seu avô paterno, pai de 17 filhos e padre católico, era filólogo, poeta, músico e pintor. Aos seis anos, seguiu com a sua família para a ilha de São Vicente e teve uma cultura vasta em relação às músicas de Cabo Verde, algo que fez questão de passar às novas gerações. Também era contadora de histórias.

Aos oito anos, começou a cantar como solista do orfeão, na igreja protestante. Seguiu-se o “Eden Parque”, no Mindelo, e os seus Serões para Trabalhadores, sempre às escondidas do pai.

A sua primeira actuação profissional foi em 1968, com 25 anos, a convite do Grupo Ritmos Cabo-Verdianos, e seguiram-se os convites do cantor Bana para actuações nos saraus que organizava.

Em Portugal, a sua primeira actuação na televisão foi no programa “Arroz Doce”, de Júlio Isidro, onde conheceu Eunice Muñoz e Marina Mota que actuavam como residentes. Isto, por ocasião da promoção do disco “Mar Azul – Cantá Mudjers”, resultante do 1º Festival de Vozes Femininas, organizado pela OMCV – Organização das Mulheres de Cabo Verde.

Figura culta da sociedade cabo-verdiana, Celina Pereira também se preocupava com a preservação da memória colectiva e da identidade do povo cabo-verdiano. O seu primeiro ‘single’ “Bobista, Nha Terra / Oh, Boy!”, foi editado em 1979, mas só em 1986 lançou o primeiro disco “Força di Cretcheu” (Força do Meu Amor), que inclui histórias e cantigas de roda, brincadeira, casamento e trabalho.

Assim, desde o seu primeiro LP “Força di Crêtcheu”, tentou recuperar a riqueza e a diversidade da cultura musical do povo cabo-verdiano.

Com pesquisas e recolhas efectuadas em Cabo Verde e na diáspora cabo-verdiana, Celina Pereira foi responsável por recuperar mazurcas, cantigas de casamento e mornas, cantigas de roda, lunduns, choros, lenga-lengas e toadas rurais e possibilitado a salvaguarda destes temas para a posterioridade.

Também actuou na comunicação social como jornalista de rádio e contadora de estórias, actividade que iniciou em liceus e escolas de Boston, Massachussets, USA, desde 1990.

Em 1990 lançou o LP “Estória, Estória… No Arquipélago das Maravilhas”, altura em que começou, paralelamente, a “actividade” de contadora de estórias sobre o imaginário cabo-verdiano.

Três anos depois, em 1993, surgiu o álbum “Nós Tradição” e, em 1998, deu corpo a “Harpejos e Gorjeios” e iniciou também uma série de duetos com artistas como o fadista Carlos Zel e o brasileiro Martinho da Vila.

“Estória, Estória? do Tambor a Blimundo”, lançado em 2004, e alvo de várias reedições desde então, é um áudio-livro que pretende recuperar o património expressivo das histórias e jogos de roda tradicionais africanos.

Devido ao seu trabalho na preservação, pesquisa e divulgação da cultura cabo-verdiana, em vida, a cantora foi alvo de várias homenagens. Celina foi distinguida no festival de música “Sol da Caparica”, pela Câmara Municipal de Almada, em Portugal, que lhe atribuiu a medalha de prata de Mérito Cultural pelo seu empenho na divulgação das artes e pela sua dedicação às causas sociais.

Em 2003, foi condecorada pelo então Presidente português Jorge Sampaio, com a medalha de mérito (grau de comendadora) pelo seu trabalho na área da educação e da cultura cabo-verdiana.

Em 2014, foi galardoada com o Prémio Carreira na 4.ª edição do Cabo Verde Music Awards (CVMA). Em 2019, recebeu uma homenagem de músicos e amigos através de uma serenata, no espaço B.Leza, em Lisboa, e no mesmo ano foi homenageada na segunda edição da gala “Noite de Autores” promovida pela Sociedade Cabo-verdiana de Música (SCM).

Em Março de 2019, também foi apresentado o livro infantil da escritora e cantora Celina Pereira “A Sereia Mánina e seus sapatos vermelhos”, o mais recente livro infantil da escritora e cantora Celina Pereira, em formato impresso na Biblioteca Nacional, na cidade da Praia.

Com Inforpress

Comentários  

0 # Pequenas correções 18-12-2020 16:30
Eu não sei quem foi que redigiu este artigo. Pela redação, parece que a fonte é de Portugal. No entanto, nossos jornalistas, como cabo-verdianos, podem ter a liberdade de corrigir algumas incorreções da fonte original se estiverem com a posse dos dados.
1 - Qualquer cabo-verdiano sabe o que significa «Força di Cretcheu», não é necessário a tradução. Qualquer cabo-verdiano sabe que é «Nôs Tradição», e não «Nós Tradição».
2 - Não é o LP «Força di Cretcheu» que inclui histórias e cantigas de roda, brincadeira, casamento e trabalho. Devem estar a confundir com o LP «Estória, Estória… No Arquipélago das Maravilhas».
3 - Diferentemente de aquilo que tem estado a ser divulgado na TCV, o LP «Força di Cretcheu» não foi editado pela Discos Monte Cara, mas sim, pela Dacapo.
4 - Constam, também, do repertório discográfico, os discos «De lá para cá», de 1998, e «Areias mornas de Bubista» de 2019.
À família da cantora, em particular, e à família cabo-verdiana, em geral, minhas sentidas condolências.
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0 # DJON DI DJÁ 18-12-2020 14:19
Dói imenso ver gente da nossa memória coletiva a morrer assim, num lar de idosos. Que a terra te seja pluma, Celina Pereira.
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+1 # António Pereira 18-12-2020 12:03
Estou triste porque a Celina Pereira já não vive para nós; mas também estou estupefato por saber que a nossa Celina Pereira foi deixada a passar o resto da sua vida fechada no lar de idosos da Santa Casa da Misericórdia. Por que não a possibilitaram apassar nos aconchegos do seu lar familiar? Celina Pereira que fez muito por nós(Cultura cabo-verdiana) devia ter merecido, de nós, muito e melhor do que o que teve nos últimos momentos da sua vida. Celina Pereira, não te esqueceremos nunca!
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+1 # CASIMIRO CENTEIO 18-12-2020 01:03
Sem dúvida que Cabo Verde perdeu mais uma nobre figura da cultura musical e não só !
As minhas mais sentidas condolências pela família enlutada !
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+1 # LEÃO VULCÃO 17-12-2020 22:00
Hoje o mundo perdeu
um pouco de seu brilho.
Hoje o céu ganhou
mais um anjo.

Vai com Deus, Morabeza.
Que a terra te seja leve.

A vida é feita de encontros e desencontros, de chegadas e partidas, e na vida vamos enfrentar muitas despedidas. Por mais que doa dizer adeus, é preciso saber que a morte um dia chega para todos.

E quanto mais nos tornamos conscientes da morte, mais devemos saber viver a vida, e saber superar as dores do adeus para seguir em frente. Da morte ninguém pode fugir, mas a vida sempre continua para alguém.

Viver é um mistério que se revela aos poucos, e a morte é o grande mistério que só se revela com o fim da vida. Cabe a quem fica após a morte de um ente amado ou amigo querido, resignar-se diante daquilo que é inevitável para todos. Resta-nos rezar e pedir paz para quem fica e para quem vai.

Hoje dizemos adeus, amanhã outros se despedirão de nós. Façamos o nosso tempo de vida valer a pena! Que mesmo com as nossas dores, saudades e tristezas, possamos ser felizes, ser fortes e adquirir sabedoria.

Há muitos sonhos a serem realizados, há muitos caminhos a trilhar. Podemos dizer adeus, mas carregar para sempre em nossos corações o amor daqueles que conosco viveram.

Dizer adeus é trocar as expectativas e as possibilidades do futuro pelo passado. É perder o presente e o futuro, e ficar com a história e memória de quem partiu. É perder a presença e ficar com a ausência e a saudade.

Por isso é tão difícil dizer adeus. Mas é preciso transformar a memória e a saudade em um sentimento vivo e sereno, e não triste e pesado. Viver em estado de dor, não traz ninguém de volta à vida. Saibamos viver o luto, mas também a hora de voltar a lutar pela vida
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