Pub
Por: Paulo Veríssimo

 Paulo Veríssimo

Tal como as pessoas, as instituições podem padecer de perturbações, algumas conjunturais outras estruturais, mas todas afectando, de forma negativa, o seu funcionamento e a atmosfera psicológica entre os seus colaboradores. Vários factores concorrem e explicam essas perturbações, sendo a insuficiência de recursos, em sentido lato, o factor mais visível, na medida em que qualquer corpo para subsistir precisa ser alimentado.

Com efeito, a ausência de decisões, quando estas são necessárias e/ou o timing em que são tomadas e efectivadas podem, igualmente, concorrer e ser um dos factores explicativos dessas perturbações, se não o factor principal. Na verdade, as decisões são, para as instituições, aquilo que o coração é para o corpo. Pois, como se sabe, o ritmo do batimento cardíaco marca o funcionamento de todo o corpo e, se parar, o corpo perece.  

Essas notas introdutórias vêm-me à colação a propósito daquilo que temos vindo a assistir em várias instituições públicas do país, todas elas com um traço em comum, ou seja, pessoas sem a devida preparação técnica e capacidade de liderança a ocupar cargos de direcção intermédia e superior, ou mesmo como dirigentes máximos da instituição.

Ocupemo-nos, por ora, daqueles que ocupam cargos de direcção intermédia e superior. Essas pessoas, na maioria das vezes, não tomam decisões e, quando confrontadas pelos colaboradores mais directos com o facto de as coisas não estarem a andar, justificam-se, qual Pilatos, que o assunto é de conhecimento ou já foi encaminhado para decisão superior. Para essas pessoas, isto constitui uma espécie de zona de conforto, ainda que os problemas não conheçam solução ou ganhem proporções maiores. E, mesmo quando dizem que reconhecem que a decisão está a demorar, uma vez que o problema continua por resolver ou se avoluma, dificilmente confrontam o dito “superior” com a necessidade de decidir o mais urgente possível ou que a decisão já peca por tardia. Outras vezes, justificam a não decisão com questões de legalidade. Paradoxalmente, além de não demonstrarem um domínio aceitável da legislação que norteia todo o funcionamento da instituição, bem assim dos actos e procedimentos administrativos, não procuram a dita via legal para poderem decidir.

Deste modo, acaba-se por criar dentro da instituição uma cadeia de não decisões tanto a nível intermédio como superior, que não só dificulta o seu funcionamento como até mesmo a estrangula em determinados sectores, resultando num clima de desmotivação e insatisfação entre os colaboradores mais comprometidos e identificados com a instituição e seus verdadeiros propósitos. E, infelizmente, esse status quo parece não incomodar ou comover as pessoas que exercem cargos de direcção intermédia e superior, pois agem ou continuar a agir como se nada estivesse a acontecer.

Contudo, o cerne de todas essas perturbações está no topo da hierarquia da instituição. A postura do dirigente máximo, seja ministro ou presidente, o transforma, em boa media, no macrocéfalo da instituição. É ele quem decide tudo, até o mais ínfimo dos detalhes. É o magister dixit da instituição. Aquilo que diz ou decide tem o valor de autoridade sobre tudo e todos. Tem de ser cumprido e executado custe o que custar e, na maioria das vezes, à margem dos colaboradores da instituição.

De igual forma, o que magister dixit não poderá ser contestado ou questionado, sob pena de aqueles que o fizeram serem rotulados de não estarem a colaborar. Na verdade, nessas instituições acabamos por ter três categorias de servidores. De um lado, aqueles que colaboram e que são em menor número, constituídos essencialmente por pessoas que ocupam cargos de direcção intermédia e superior e mais alguns servidores (seguidores do magíster) escolhidos a dedo. De outro lado, temos aqueles que não colaboram, segundo o rótulo, porque contestam ou questionam, em termos de pertinência ou prioridade para a instituição, aquilo que o magister dixit ou decide. Temos ainda aqueles com os quais, por alguma razão, não se conta de forma permanente. Essas duas últimas categorias constituem a maioria dos servidores da instituição, daí a razão de ser do clima de desmotivação e insatisfação que grassa no seu seio. E, por razões diversas, são relegadas para a plateia. Afinal, é daí que se vê melhor o barco a passar (afundar-se).

Comentários  

0 # Paulo Mendes 11-10-2018 14:10
Parabéns, meu caro. Um excelente artigo, directo ao ponto, tocaste no cerne da questão de muitas instituições públicas em Cabo Verde. Infelizmente, a inércia e a indiferença de muitos dirigentes promovem a desmotivação dos seus colaboradores, com consequências negativas para a instituição.
Responder
0 # Benvindo 24-08-2018 10:27
Valeu Paulo. Excelente artigo e muito equilibrado. Nunca perca este seu equilíbrio. Abraço
Responder
+1 # Bsptista 14-08-2018 00:07
Boa Paulo, meus parabens! Acertaste na mosca ...como se diz por aí ..este é o cancro que grassa este nosso Admin. Publica
Responder
+1 # Maria 12-08-2018 17:46
Excelente artigo. Continua a publicar sempre.
Responder
+1 # Joana 12-08-2018 11:41
Parabéns, Paulo. Uma análise pertinente!
Responder
+3 # #Arena Crítica 12-08-2018 02:21
A meritocracia não existe em Cabo Verde. O que temos é a distribuição de tachos de acordo com as afinidades políticas ou amizades de taberna. Quem quiser dar um contributo efetivo para melhorar o estado de coisas em que nos encontramos, está sujeito a um conjunto de obstáculos, de forma a enviabiliza-lo de dar esse contributo. Os nossos políticos não pensam seriamente no desenvolvimento deste país. Se pensassem teriam como critério primário a meritocracia na escolha dos dirigentes intermédios e superiores.
Responder