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Carla Carvalho

Em Cabo Verde, as mulheres se exprimem, ainda, de uma forma tímida em espaços públicos tradicionalmente dominados por homens. Por exemplo, as estatísticas indicam que, no Parlamento, elas representam 23.6%, no Governo, são 23.1%, na Presidência das Câmaras Municipais, são 0.0%, nas Vereações, são 26.1%, na Presidência das Assembleias Municipais, são 13.6%, enquanto Eleitas Municipais, são 26%, na Presidência das ONG e Associações de Base Comunitária, são 11.1%.

Este é o quadro da participação das mulheres nas esferas públicas de decisão em Cabo Verde, em particular nas da participação política e associativa. O que significa que o poder político e público é masculinizado e dominado por homens.

Um árduo trabalho tem sido feito para reverter este quadro, um trabalho de advocacia para aumentar a participação das mulheres, no sentido de o país atingir a paridade, ou seja, uma margem de até 40% de participação efetiva das mulheres na vida política. Porém, os resultados têm sido insuficientes, e se medidas não forem tomadas andaremos como caranguejo, correndo inclusive o risco de perder o pouco chão andado até aqui.

De facto, as mulheres cabo-verdianas enfrentam um conjunto de obstáculos para participarem da esfera pública, desde sociais a culturais. De um lado perfila o facto de as mulheres desempenharem duplas, triplas ou até mais jornadas de trabalho – trabalho doméstico, cuidado de dependentes, na comunidade, (estes normalmente não remunerados) e atividade profissional remunerada, consumindo grande parte do seu tempo. De outro lado, os estereótipos de género são reais e estão aí enquanto ideias pré-estabelecidas que situam mulheres e homens em planos diferenciados e desiguais.

A política, especialmente a partidária, enquanto um espaço de relações de poder, é disputado no “sangue”, apesar das narrativas e das retóricas sobre os propósitos da participação nesta área. Entretanto, enquanto um espaço histórico, cultural e socialmente masculino, a entrada das mulheres aqui e a participação nesses cargos de decisão ou nas funções políticas mexem com o status quo dominante e reduzem os privilégios historicamente estabelecidos.

Por isso, nada é inocente nesse espaço. Nenhuma ação é neutra. E, sabendo do lugar que as mulheres, historicamente, estiveram, e estão, votadas, a que se acresce a crença culturalmente imposta de que se trata de uma posição que deve continuar, muitas vezes, o recurso a determinadas estratégias para descredibilizar e desmoralizar as suas expetativas e interesses, com mimos de que a política não é lugar de mulheres, que é suja, entre outros epítetos conhecidos de todos, é uma tentação permanente e um recurso recorrente dos “guardiões do templo”.

As imagens manipuladas da Janira Hopffer Almada, presidente do PAICV, não é uma brincadeira de mau gosto, é, antes, o espelho de uma sociedade machista que defende – muitos no silêncio das suas mentes – que lugar de mulher não é nos espaços público-político-partidário de liderança e de decisão. É uma tentativa de emudecer as mulheres, mostrando-lhes que esta não é sua arena. Por outro lado, estas imagens, subitamente aparecem num momento em que as mulheres – de todas as forças político-partidárias – têm sobre a mesa a discussão da lei da paridade. Um momento oportuno?!

A Janira Hopffer Almada, que conheço, é uma mulher forte, assertiva, corajosa e portadora de um profundo sentimento de comprometimento com as causas e as consequências do processo de desenvolvimento destas ilhas. Não é uma imagem manipulada que a vai enfraquecer. Não será com estas estratégias criminosas que as mulheres deixarão de participar nas esferas públicas e político-partidárias.

Creio eu, e assim espero, que este momento servirá sim, para indignar as mulheres, aumentando, cada vez mais, o número daquelas que quererão participar destas instâncias, representando outras mulheres, e contribuindo, verdadeiramente, para o desenvolvimento do nosso Cabo Verde.

 

 

Comentários  

0 # Arena critica 06-10-2018 19:20
O machismo é um fenómeno mundial. Nos países mais desenvolvidos subsiste de uma forma latente , nos países pobres subsiste de uma forma patente. Em Cabo Verde o machismo é fenómeno ainda muito marcante na sociedade. Só para se ter uma ideia, a maioria das mulheres tem uma mentalidade machista. Isto é, pensam que os homens devem estar a frente de tudo que é relevante na sociedade.
A primeira coisa que se tem de fazer é mostrar a essas mulheres que elas têm capacidades semelhantes a dos homens.
O sucesso das mulheres na política dependerá muito da sua atitude perante os problemas sociais, e nem tanto de uma atitude de conflito com os homens. Dito de outra forma, a baixa participação das mulheres na vida política deve-se sobretudo a uma estratégia pouco convincente por parte das mulheres. O caso da Janira é paradigmático. Jandira apresenta muitas vezes no seu discurso tiques de autoritarismo. Com isso não se chega a lado nenhum. Para ser primeira ministra de Cabo Verde, coisa que dificilmente acontecerá se continuar com essa postura, precisa ser mais incisiva nas propostas que apresenta ao país, por um lado, e ter uma postura crítica com base na realidade do país, por outro lado.
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0 # Carlos Alberto Andra 06-10-2018 15:31
Parabéns Carla, pela forma acertiva como abordas a defesa da participação das caboverdeanas na politica. Também acho que, quem considerou que podia beliscar minimamente a determinação da nossa líder, Dra. JHA, com esse acto ignóbil, por não à conhecerem, falharam. Eu não conheço ninguém mais determinada, e disponível para o trabalho en prol das nossas causas.
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